domingo, 27 de junho de 2021

De trago em trago

Tenho fumado muito esses dias e cheguei a conclusão de que a culpa é sua. Cada trago que dou é uma tentativa de resgatar a memória do seu gosto. Não que você tenha gosto de cigarro, mas há algo nele que ressoa nossos beijos marcados pela fumaça mentolada, as conversas, o vento frio e o sereno. 

Este é um dos singelos gatilhos que me ajudam a acessar essa memória da sua presença, o frio na barriga de sentir sua pele contra a minha, de ouvir sua voz e poder trocar olhares com você. 

Porque cada um desses momentos é tão onírico que passam essa impressão, de serem sonhos. E como sonhos, fico a tatear a realidade em busca de portais que me permitam ir a seu encontro. 

Não te guardo num sonho, mas ao contrário, você faz da realidade um lugar com mais possibilidades, de encontros, de trocas, de afetos que me fazem querer que tudo seja mais como esses momentos. E já que não são, fico a espera dos próximos, um trago de cada vez. Feliz por ter a promessa deles.   

No meu peito lágrimas, pedras

Há uma pedra em meu peito.

A cada batida sinto ela esmagar um pouquinho mais meu coração. E a cada lágrima contida, mais espaço ela ganha. Comprime meus pulmões e quase falta espaço para o ar. Qualquer dia meu tórax vai se romper restando apenas a pedra exposta, dando vazão às lágrimas represadas. Não tenho vergonha das minhas lágrimas, apenas me acostumei a liberá-las em segredo e ainda hoje as preservo como algo proibido ao mundo. Quando elas vêm, como uma onda gigante e incontrolável, me tomam como seu e a elas pertenço, sou elas. E às vezes, eu só não queria mais ser apenas isso, as lágrimas.

Confino-me então num paradoxo, e assim, me escondo com medo de afogar mais alguém. Me torno a água que escapa pelos dedos, quero descer pelo ralo inundado em meu desalento sem ser notado. Ou pelo menos assim me convenço. Na verdade, grito em silêncio para que não me deixem descer. Por favor, não me deixem afogar em mim mesmo porque se eu for, posso acabar não tendo forças pra emergir. Essa pedra no meu peito, como uma âncora, me permite nadar no profundo da minha alma e perceber todos os tons de azul que carrego. Mas chegada a hora de subir, quanto mais demoro, mais difícil fica para voltar. Se eu parar de oferecer resistência posso acabar ficando de vez.

Será que eu quero?


... Não.

Azul

Mergulhei no fundo da minha alma para entender minha tristeza.

Tive de voltar, ou morreria afogado.
Certas tristezas, é melhor que permaneçam indecifráveis.
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Epílogo
Ao mergulhar, constatei: minha alma é azul…

sábado, 12 de junho de 2021

1/3 de tristeza

O ser humano é altamente viciável. É quase uma necessidade. A gente se vicia em álcool, cigarro, trabalho... tristeza. Eu devo ser viciado nessa porra, um terço de mim é tristeza. Não tem um dia em que consigo ficar feliz sem achar que algo de ruim vai acontecer, é quase como se eu estivesse pedindo pra ser magoado. Pode parecer loucura, mas, não é loucura você fumar uma vida inteira sabendo que aquilo vai te matar? Pior que não. Se isso é tudo que você tem sido, se é a única certeza na sua vida, você não vai querer isso todo dia? Você sabe que sim. A gente deixa um lugar guardado. Mesmo que seja uma vergonha. Aquele sentimento e tudo que vem com ele, já é de casa, é uma extensão da gente. As pessoas param de fumar, dizem que se curaram, mas no fim todo mundo só troca um vício por outro. Já eu? Bem, eu nunca fui bom com mudanças.

Os mesmos dias

E nas horas que o céu escurece   A noite embala meu pesar Mesmo estando ao meu lado parece Que aqui você já não está E como um rouxinol Meu ...